Há 18 anos fiz uma viagem que ficará para sempre tatuada na minha alma. Em agosto, quis revisitar dois locais que descobri naquela que foi a minha primeira grande aventura pelos caminhos de Portugal. No dia de São Bernardo, a Ellen (não a Degeneres, mas a depressão) resolveu dar o ar de sua graça e ofereceu-nos o romantismo de uma chuva de verão, abençoando assim o nosso regresso ao Mosteiro de São João de Tarouca e ao Mosteiro de Santa Maria de Salzedas. Eu prometi que escrevia um post sobre estes dois locais pertencentes à Ordem de Cister e as promessas são para se cumprir.

Há 18 anos, quase a fazer 19, eu e Mr. J. partimos em viagem de lua-de-mel. Um querido amigo, que já não está entre nós (talvez esteja, quem sabe, junto de São Bernardo), desafiou-nos a visitar alguns dos locais mais marcantes da Ordem Cisterciense em Portugal. Amantes de história e de sítios sagrados, achámos que seria fantástico colocar num roteiro, toscamente traçado, alguns mosteiros desta ordem que teve a sua origem em 1098. Foi inesquecível, ao ponto de querermos voltar. 20 de agosto de 2020, foi o dia.

Lembro-me bem da primeira vez que pisámos o chão de Mosteiro de São João de Tarouca, no Vale Varosa, e nunca mais esquecerei a alma apaixonada que nos guiou numa visita cheia de pormenores e de história. Os anos passaram e o primeiro mosteiro cisterciense masculino construído em Portugal continuou lá. À sua volta teve lugar uma das maiores intervenções arqueológicas no nosso país, permitindo, hoje, ao visitante compreender o edifício tal como ele era, antes da extinção das ordens religiosas em Portugal. De mapa numa mão e chapéu-de-chuva na outra caminhámos pela história. Os anos passaram e no antigo celeiro ergue-se um Centro Interpretativo. Está tudo diferente, mas a igreja abacial, essa mantém-se igual: o nicho com São João Baptista, o túmulo de 13 toneladas do filho bastardo de D. Dinis, o cadeiral barroco, o quadro que representa São Pedro… Só não está lá aquela alma apaixonada que nos recebeu há 18 anos com tanta dedicação.

Lembro-me bem da primeira vez que pisámos o chão do Mosteiro de Santa Maria de Salzedas e nunca mais esquecerei a revolta e a tristeza que sentimos. Após a extinção das ordens religiosas, em 1834, a decadência tomou o lugar de assalto. Há 18 anos, a igreja era o único edifício digno. Tudo à sua volta era desolação. A história perdia-se todos os dias numa paramenta carcomida pelo tempo ou nas folhas de um livro de cantochão espalhadas pelo soalho. Lembro-me bem do claustro abandonado. Algumas das dependências monásticas foram vendidas em hasta pública. Hoje, ainda há muito trabalho para ser feito, mas a revolta deu lugar à serenidade e a alegria ocupou o lugar da tristeza. Hoje, Salzedas renasce das cinzas da ignorância. É possível percorrer as memórias de outros tempos através de um trabalho de restauro notável e que podemos acompanhar num vídeo inspirador. Dezoito anos depois perdi-me num sorriso tolo ao longo de um corredor imaculado, guardião de peças artísticas que sobreviveram a anos de abandono e pilhagem.

Sabia que tinha de voltar. O regresso aconteceu no dia de São Bernardo, o monge que mandou edificar o Mosteiro de São João de Tarouca. Não foi intencional, mas quis o destino que no dia 20 de agosto de 2020, fossem escritas novas memórias.
Rosarinho
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