No domingo questionava-me sobre o que escrever esta semana no blog. Acho que pela primeira vez, em muitos anos, a minha lista de ideias para posts tinha chegado ao fim. Sentei-me no escritório a refletir sobre isto de estarmos enfiados em casa. As miúdas andavam sempre de um lado para o outro e com muito material precioso nos seus cadernos para transformar em posts. Num estalar de dedos, silêncio. No entanto achei que este podia ser um excelente momento para espicaçar a minha criatividade. Não me enganei. Hoje escrevo-te esta carta.

Querida pessoa que estás desse lado,
Espero encontrar-te bem. Estes têm sido dias de isolamento que nos tiram o sol do rosto, o vento dos cabelos e a alegria de caminhar livre. Deves sentir falta das pequenas coisas, como eu. Na verdade não são pequenas. Agora percebemos como eram valiosas. Já as tínhamos como garantidas e por isso pareciam que nunca as iríamos perder: um abraço, um beijo repenicado na bochecha, um toque de mão, um café ao final do dia, um passeio na praia, uma ida à livraria, a companhia de quem nos é querido… sair de casa e respirar fundo sem medo.
Estes dias não têm sido fáceis para mim e acredito que para ti também não. Sabes, tenho olhado pela janela, que me revela um pedacinho de mundo, e sinto que os pássaros estão felizes. Isto quer dizer muito. Enquanto tu e eu estamos entre quatro paredes, a terra finalmente respira. Dá que pensar. Será esta a nossa última oportunidade?
Como têm sido os teus dias? Eu tento manter alguma rotina para me defender da ansiedade. Mas, também tenho apostado em novas aventuras. Atirei-me para fora de pé e gostei. Até fiz um direto no Instagram! Não sei se viste… Acho que não correu mal. Sempre gostei de arriscar. Agora é uma boa altura. Pelo menos sinto-me viva!
Sabes que mesmo neste caos diário em que vivemos existem coisas muito boas. Estou em casa desde o dia 16 de março. Só abro a porta para ir às compras, para passear higienicamente e para dar apoio à minha mãe de 84 anos que vive sozinha. Ainda assim tenho tido dias surpreendentes, pelos quais estou grata. O que me faz pensar que o nosso foco muitas vezes é traiçoeiro. Porque ilumina aquilo nos martiriza quando devia de dar destaque ao que nos maravilha e que nos nutre.
Na segunda feira o carteiro tocou duas vezes. Abri-lhe a porta. Entregou-me uma encomenda acabada de chegar da Madeira. Lá dentro dois livros: um para mim e outro para a Susana. Junto uma carta de afetos, escrita à mão. Como deves calcular fiquei muito feliz! Eu adoro escrever e receber cartas e postais (nota-se não é?). Pouco antes deste mundo estranho entrar em cena eu estava determinada a escrever mais cartas, porque acredito no seu poder. Fiquei triste, tive de adiar o meu empreendimento. É num momento em que a solidão da minha caixa do correio parece ser uma certeza, que recebo uma carta. Se isto não é surpreendente, não sei o que será. Concordas comigo?
No domingo estava a assistir a um filme e a determinada altura um dos personagens, cuja missão era fazer chegar a correspondência a lugares longínquos, disse que o que ele transportava não era correio, eram vidas. Aquilo tocou-me.
Gostava de te ter escrito esta carta à mão. No entanto uma ida aos CTT, hoje, é uma aventura arriscada. Melhores dias virão e quando eles chegarem vou estar pronta. Haja papel, postais, envelopes, canetas coloridas, porque esta miúda vai abraçar o mundo!
Fico a aguardar notícias tuas.
Beijinhos,
Rosarinho
p.s. – O que é que te surpreendeu hoje?
4 Comentários
Alfreda Pinto
Abril 2, 2020 at 4:27 pmO que me surpreendeu hoje foi sem dúvida esta tua carta “virtual” tão linda, cheia de verdade, empatia e muito carinho.
Fico muito feliz que em meio a este “caos” recebeste a minha singela carta e que ela significou tanto para ti.
Obrigada. Adorei, continua a escrever-nos mais cartas, ainda que momentaneamente elas sejam virtuais.
Rosarinho
Abril 3, 2020 at 12:25 pmQuerida Alfreda,
Obrigada pelo carinho deixado aqui no blog.
A tua carta coloriu o meu dia. Chegou no dia e hora certa.
Está prometida uma resposta escrita à mão.
Beijinhos
Margarida Rebelo
Abril 7, 2020 at 11:52 amQuerida Rosarinho
Foi bom receber a tua carta, nesta fase, virtual, e não deixou de ter calor nas palavras!
Vai correr tudo bem!
Continua a escrever!
Beijinhos
M.ar
Rosarinho
Abril 7, 2020 at 5:31 pmQuerida M.ar!
Saudades tuas. Fico feliz que a minha carta tenha chegado ao teu coração.
Escrever tem sido uma fuga de casa 😉
Beijinhos e brevemente daremos um abraço. Vamos acreditar.